sexta-feira, 4 de abril de 2014

AUTISMO: O PERCURSO DO DIAGNÓSTICO À LUTA, POR CRISTINA SILVEIRA

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Hoje, enquanto eu assistia a um depoimento de uma mãe sobre as dificuldades  enfrentadas por ela, depois que soube do diagnóstico de seu filho autista, fiquei muito emocionada. Cada palavra, cada uma delas, desenhava um retrato fidedigno da dura realidade vivenciada por estas guerreiras.

Inicialmente, a dificuldade para se ter um diagnóstico correto. Deus, que via sacra! Vejo isso acontecer até hoje em meu consultório. Pais que chegam cansados de passar de um profissional para outro, um verdadeiro calvário. De consultório em consultório, até descobrir o diagnóstico certo. E isso pode levar anos…  Porque os profissionais não podem ser capacitados para detectar esse diagnóstico precocemente? Porque as universidades de medicina, psicologia, pedagogia e outras ainda não se atentaram para a importância dessa disciplina? Quanto tempo de sofrimento seria poupado a estas famílias! Essa é a pergunta que não quer calar.
Então, depois do diagnóstico, vem o luto.
Nesse momento surge uma questão mais íntima, dolorosa e igualmente difícil de colocar: “Porquê?”  Ouvir que seu filho tem autismo pode trazer uma grande variedade de emoções. Do medo ao alívio, da apreensão para o pânico. Toda essa carga energética pode trazer intensos sentimentos: a negação e o isolamento. Depois a raiva, a depressão e por fim a aceitação. E sem o “ luto” cumprido não há como avançar. Ou seja, é imprescindível aceitar a situação e agir rapidamente.
Mas, depois do luto, muitas vezes vem o abandono. O abandono que os pais sofrem de seus amigos e às vezes dos próprios familiares. Isso é real e muito triste.  E algo pior ainda pode acontecer: muitas mães podem ser abandonadas pelos seus maridos, que muitas das vezes não conseguem elaborar a situação. Pois é… enfrentar todas as dificuldades trazidas por um diagnóstico de autismo é missão para guerreiras!  Não é para qualquer um.
Contudo, uma das poucas certezas que há em relação ao autismo é que, quanto mais cedo houver intervenção terapêutica, melhores são os resultados alcançados nos tratamentos.
Porém, nenhuma família está preparada para um caminho de dificuldadesque está por vir. Muitos pais e suas crianças autistas se sentem órfãos do Estado e do Sistema Nacional de Saúde. É uma luta constante em busca de tratamentos especializados no SUS ou em outras instituições públicas, quando não se tem condições financeiras para arcar com profissionais gabaritados, que atendem normalmente em consultórios particulares.  Será que o governo ainda não percebeu que existe no Brasil um aumento significativo no número de crianças diagnosticadas? E que o tratamento precoce é importantíssimo? Por isso, cada vez mais, são necessários esforços conjuntos da sociedade e governo para que possamos melhorar esse atendimento e o diagnóstico.

Mas a ignorância é democrática. E nem os técnicos de educação escapam. Além de todas essas dificuldades, teremos mais uma outra dificuldade por vir.
A escola, que consideramos o segundo espaço social da criança, depois da família, onde ela aprenderá valores, onde ela se socializará com outras crianças e onde aprenderá conteúdos acadêmicos, às vezes nega esse direito às crianças autistas.

Assim como tenho presenciado muitas instituições escolares que estão tentando acertar no processo de inclusão escolar, presencio ainda hoje, infelizmente, instituições que andam na contramão do processo de acolhimento humano.

Sinceramente penso que, de todas as dificuldades vivenciadas pelas famílias, esta é a que dói mais. A que machuca mais: negar a inclusão escolar a uma criança.  Dói, porque profissionais da educação estudam uma vida inteira para acolher, orientar e educar crianças. E não estão preparados para receber uma criança autista? Não estão preparados para ensinar uma criança autista?

Muitas crianças estão isoladas, machucadas, incompreendidas, sofrendo bullying, tristes e abandonadas intelectualmente.

Mas como diz o jargão: somos Brasileiros e acreditaremos sempre!

Acreditamos que os profissionais da saúde, os educadores, os familiares e a sociedade em geral ainda perceberão a necessidade urgente de capacitar-se. Senão aceitar o diferente. Sair do discurso inclusivo vazio e partir para a acão inclusiva de fato!  Afinal, o autismo é uma realidade e a inclusão social e escolar é um processo que não tem volta. A demanda só tem aumentado e continuará nesse ritmo.

E muito além de um processo inclusivo, existe um ser. Existe uma criança esperançosa de ser compreendida, de poder exercer o seu direito de pertencer. E para isto, precisa de você e do seu amor.

Acredite.

Cristina Silveira – Psicopedagoga e Psicanalista, especialista em inclusão escolar.

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